DA FEIRA DO
LIVRO DE LISBOA
Entrevistado: Ângelo
Rodrigues
(Coordenador de atividades literárias e de projetos culturais)
Reformulação
de uma entrevista concedida à Revista
«OS MEUS LIVROS» por
altura da Feira do Livro de Lisboa de 2001
1
- Quais as expetativas para a Feira do Livro
deste ano?
As
expetativas são sempre as melhores. Todos os anos renasce a esperança que é a
última a morrer. Desejo que este ano a feira seja melhor que nos anos
anteriores em todos os aspetos: desde a logística e a funcionalidade até à
programação cultural que não tem sido a melhor e a mais pertinente para um
evento desta natureza. Estou um pouco cansado da mesma conceção de eventos. Inovar é
preciso e urgente! É necessário também convidar "outras" pessoas
(programadores e criativos para além de "outras" instituições). Esta feira tem
alguns vícios porque - entre outras razões - me parece que são sempre os mesmos
a refletir e a executar. Contudo, admito estar enganado.
2 - Que balanço faz da Feira do Livro nos últimos anos?
Trata-se,
de facto, de um evento marcante para a cidade de Lisboa e para o país. Se eu
tivesse algum poder sobre a organização e conceção da feira, alteraria cerca de
cinquenta por cento de tudo um pouco. Entre outras medidas a refletir com mais
calma e tempo, retirava a feira do local onde se encontra e procuraria, como
medida principal, organizar - com bastante antecedência - um bom e eclético programa
cultural o que nem sempre se tem verificado pois são, inexplicavelmente, sempre
os mesmos no protagonismo dos eventos. Este evento necessita urgentemente de
ser modernizado e adaptado às novas exigências e aos novos hábitos de um público
que é cada vez mais - e ainda bem - exigente.
3 - Em que medida pode contribuir um evento desta natureza
para o mercado livreiro?
Para
mim é evidente que esta feira exista, se desenvolva e se modernize (com tudo o
que isso implica) para bem do mercado livreiro - principalmente os pequenos e
médios editores. Para muitos, as vendas só são razoáveis por esta altura do
ano. Tenho uma teoria muito peculiar e pouco ortodoxa que revolucionaria o
mercado do livro mas por agora - também por uma questão de tempo - limito-me a
deixar esta pequena provocação: acabem com as vendas de livros nos hipermercados
e fechem, de vez, as livrarias demasiado seletivas, preconceituosas e algo
pretensiosas; uma boa livraria deve ter tudo, exactamente TUDO. Se comprarem os livros diretamente aos
editores muita coisa poderá melhorar tal como a redução do preço dos livros e o
consequente aumento do consumo bem como o provável e desejável desenvolvimento
dos hábitos de leitura.
Parece uma proposta paradoxal mas garanto que não é. Com a Internet e as redes sociais,
muita coisa mudou. Eu e a minha família (como tanta gente) adquirimos vários
livros e é raro fazê-lo nas livrarias e muito menos nos hipermercados e nas
grandes superfícies.
4 - Concorda com os moldes em que este evento é feito? O que mudaria?
Digamos
que concordo com uma parte e outra não. Como já referi, a programação cultural
devia ser mais cuidada e realizada com mais tempo de antecedência. Além disso,
penso que seria desejável envolver mais as escolas e outras importantes instituições.
Como já referi, mudava o local, a estética geral da Feira e o tipo de promoção da
mesma.
5 - Quais as grandes diferenças que encontra, comparando este
evento com outras feiras no estrangeiro?
Em
muitos aspetos, precisamente o contrário do que referi atrás: melhor promoção
do evento e das editoras; mais apoio aos editores e aos intervenientes
(artistas, escritores e outros agentes) do programa cultural; melhores condições
e infraestruturas. Mas também há coisas muito boas que não mudaria.
Penso que, com o mesmo tipo de investimento económico e humano se poderia fazer
muito melhor. É também uma questão de carolice, vontade, criatividade, gosto e
empenho.
6 - Em que medida estes eventos podem ser importantes para as
cidades que os acolhem?
Penso
que a importância é óbvia. Não imagino a cidade de Lisboa sem uma feira do
livro com esta dimensão. Esta feira faz parte integrante do "património" e do ADN desta
grande e amada cidade.
7 - Concorda com a forma como o espaço está distribuído? Em
caso negativo, porquê?
O
Parque Eduardo VII é um local aprazível, bonito e central da cidade mas não
oferece outro tipo de condições tidas como fundamentais ao evento. Trata-se de
um espaço desnivelado e ao ar livre. É raro o ano em que não chove durante a
feira com as consequências óbvias para as vendas e para a cativação de público.
Quanto à distribuição de espaços, não me parece o melhor. Além de tudo isto,
continua-se a fazer experiências todos os anos com nefastas consequências para
os editores e para os visitantes. Dá a sensação que a feira é pensada e
executada "em-cima-do-joelho". Ora, um evento desta natureza devia ter um plano
bem elaborado e competente e o seu projeto devia começar logo que termina a
última feira; enquanto isto não for interiorizado e assumido por quem de
direito, será sempre mais do mesmo.
8 - Que comentários lhe merecem a cobertura mediática a este
evento?
Já
me referi um pouco a isso dizendo que devia haver uma maior e melhor cobertura
mediática. Se me é permitido uma sugestão, tentem este ano - talvez ainda
possam ir a tempo - envolver mais as escolas. Sei, por experiência própria
(também sou professor), que pouca ou nenhuma informação (promoção/divulgação)
chega às escolas sobre este grande evento da capital e do país. Oxalá tudo
melhore um pouco mais nesta edição!